sábado, 18 de junho de 2011

A lapa

Cola-se de novo. Como já o tinha feito anteriormente a outras. Precisa de se segurar a alguma coisa para não cair. Encontra uma rocha, dura, segura e bem presa e colas-se. E fica lá, colada. Não larga. Tira o que pode, muitas vezes o que quer. Leva ao cansaço ou à exaustão até, porque precisas de se segurar. Não pode cair. A queda dói muito, pensa a lapa! Alimenta-se da rocha e ela perde a sua força. Lentamente, sem se aperceber.

Até chegar o dia em que não tem mais nada para se alimentar. Até chegar o dia em que a rocha se apercebe que afinal já não quer mais a lapa colada a ela. Mas está muito presa. A libertação não é fácil.

Cada tentativa que faz, raspa um pouco da rocha. A rocha sofre. Perde força. Não se consegue segurar mais porque as correntes são muito fortes, muito intensas e seguidas. Uma atrás da outra, quase sem intervalo. A água fica turva. Não se percebe muito bem o que se está a passar. Só aqueles que estão perto da rocha sentem as vibrações que ele emite cada vez que toca no chão, de novo.

Tenta libertar-se, com tudo o que tem, da dependência que criou pela lapa. Acaricia-lhe a pele para que se consiga soltar suavemente. Expulsa-a ferozmente. Finge que a lapa não existe… E no meio de cada tentativa, diferente da anterior, tenta explicar à Lapa que estar presa a uma rocha não a leva longe, que assim, não consegue ver por ela própria o que existe para além da rocha, que nunca irá ser uma lapa porque está sempre colada a uma rocha e que a concha não a vai proteger por muito tempo.

A lapa não ouve. Não quer ouvir. Estar bem segura à rocha é o que faz sentido. Tudo o resto é desconhecido e isso assusta.

Mais uns rasgões. Mais tortura. Dói! Muito. Mas o cansaço ganha. O cansaço de sentir esta dor. A rocha decide segurar-se de novo ao chão firme. O que a lapa quer já não é importante.

E faz-se luz! A rocha apercebe-se que afinal ela foi sempre a rocha. Forte, dura, segura e bem presa e a lapa, é só uma lapa. Pequena, escondida numa concha e colada a uma rocha.